Alergia Alimentar – Perguntas e Respostas

1.       O que é alergia alimentar?
Alergias alimentares são reações do sistema de defesa (imunológico), contra proteínas presentes em um alimento, reconhecidas como “inimigas” do organismo.  As manifestações podem ocorrer em minutos, horas ou dias após a ingestão do alimento. Reações a toxinas de alimentos ou secundárias a deficiências de enzimas responsáveis pelos processos digestivos podem se apresentar de maneira semelhante às alergias, porém seu diagnóstico, tratamento e história natural são distintos.  

2.       Qual a diferença entre alergia a leite e intolerância à lactose?
A alergia ao leite envolve mecanismos imunológicos contra as proteínas do leite (caseína, alfa-lactoalbumina, beta-lactoglobulina), enquanto a intolerância é um processo secundário à deficiência da enzima responsável pela digestão do principal açúcar do leite, a lactose. Sendo assim, o termo “alergia à lactose” é erroneamente utilizado. Muitas vezes os sintomas das duas doenças podem se confundir, nos casos de diarreia, distensão abdominal, gases e fezes explosivas. Deve-se lembrar que as alergias são mais comuns na infância, enquanto que a intolerância geralmente se manifesta em crianças maiores e adultos. Enquanto o intolerante pode consumir derivados de leite em quantidades pequenas sem reações, o alérgico a leite deve ter sua dieta isenta de toda e qualquer proteína do alimento.

3.       Como é feito o diagnóstico das alergias alimentares?
       A suspeita inicial de alergia alimentar acontece quando o paciente apresenta sintomas compatíveis com alergia por ocasião da ingestão/contato de um determinado alimento. Os sintomas devem ocorrer sempre que houver a ingestão/contato com aquele alimento. Como o espectro de sintomas é muito variável (manchas na pele, inchaço de olhos/boca, diarreia, vômitos, entre outros) e comum também em outras doenças (intolerâncias, reações a alimentos deteriorados), é muito importante a consulta com o especialista, que poderá, conforme o caso, solicitar exames específicos para auxiliar o diagnóstico. Os únicos testes que realmente comprovam a alergia, no entanto, são os testes de provocação oral, realizados em ambiente apropriado, e sob supervisão do médico, que avalia possíveis reações após a ingestão do alimento.

4.       Quais são os principais alimentos responsáveis pelas alergias?
Embora uma grande variedade de alimentos seja consumida ao longo da vida, as alergias alimentares ocorrem por um grupo restrito de alimentos. Cerca de 80% destas reações são desencadeadas por leite, ovo, soja, trigo, amendoim, castanhas, crustáceos e peixes. Existe ainda uma alta sensibilização ao milho entre a população brasileira, embora os casos de alergia não tenham sido amplamente descritos. Entretanto, é importante estarmos atentos ao surgimento de novos alérgenos, uma vez que as características da população e seus hábitos alimentares vêm se modificando. Frutas como kiwi e sementes como o gergelim também são alimentos com aumento de prevalência de reações alérgicas. Por apresentar uma variedade muito ampla na alimentação, existe uma regionalização dos alimentos mais comumente associados a alergias entre os diferentes Estados brasileiros. Por outro lado, cacau, corantes e carne de porco são alimentos menos alergênicos do que se acreditava.

5.       As alergias duram para sempre?
As características de cada alérgeno (proteína do alimento responsável pelas reações) são distintas e por isso a duração das alergias varia de acordo com o alimento em questão. Alergias que se iniciam mais comumente na infância (leite, ovo, soja, trigo) apresentam maior probabilidade de se resolver até a adolescência (tolerância oral). Outros alimentos, como amendoim, castanhas, peixes e frutos do mar, são tipicamente persistentes e apenas uma ínfima parcela dos pacientes remitem sua alergias.  

6.       Quais os principais sintomas das alergias alimentares?
Os sintomas variam de acordo com o mecanismo imunológico responsável pela alergia, a saber:

  1. mediadas por imunoglobulinas E (IgE): reações imediatas (segundos até cerca de 2 horas após a ingestão); podem acometer a pele (urticárias, manchas avermelhadas, inchaço de olhos e boca), sistema respiratório (sintomas nasais, broncoespasmo abrupto), gastrintestinais (diarreia e/ou vômitos imediatos) ou sistêmicos (anafilaxia). Geralmente são reações mais graves, às vezes com potencial com risco de morte.
  2. não mediadas por IgE: acometem principalmente o trato gastrintestinal (doença do refluxo gastresofágico, diarreia, vômitos, muco e/ou sangue nas fezes, podendo culminar em prejuízos no ganho de peso e estatura). As reações são tardias, dias ou semanas após a introdução alimentar e geralmente associadas a múltiplos alimentos.

7.       Existe cura para alergia alimentar?
Até o momento não existe cura para alergia alimentar. Da mesma forma, medicamentos não são indicados para evitar ou prevenir reações alérgicas. O tratamento consiste na eliminação do contato, inalação ou consumo do alimento envolvido. Alguns pacientes com diagnóstico de alergia alimentar podem desenvolver tolerância ao alimento envolvido, isto é, o alimento pode ser consumido sem manifestações alérgicas. Isso pode ocorrer em algumas crianças que apresentam alergia ao ovo e leite de vaca, e só deve ser avaliada pelo médico especialista que a acompanha. Introduzir alimentos aos alérgicos sem avaliação do especialista pode causar reações alérgicas graves.

8.       Quais os leites mais utilizados para substituição no caso de alergia ao leite de vaca?
O leite materno é apropriado para a maioria das crianças com alergia ao leite de vaca e deve ser sempre estimulado como primeira opção. Quando a criança mantém sintomas decorrentes do leite ingerido pela mãe, ela deve ser submetida a dieta isenta de leite  e seus derivados e a amamentação deve permanecer. Se ainda assim os sintomas persistirem ou na impossibilidade de manter a amamentação, fórmulas especiais, com reduzida alergenicidade, deverão ser introduzidas. Estas fórmulas são nutricionalmente adequadas e compostas por proteínas de tamanhos reduzidos (fórmulas extensamente hidrolisadas) ou apenas por amino&a
acute;cidos. A determinação do tipo de fórula a ser utilizada depende da natureza dos sintomas, idade da criança e condição nutricional. As fórmulas de soja podem ser utilizadas em crianças maiores de seis meses, com reações imediatas (mediadas por IgE) e sem comprometimento do trato gastrointestinal. Fórmulas parcialmente hidrolisadas (“HÁ”) não devem ser utilizadas para tratamento. Leite de outros mamíferos (cabra, ovelha, búfala…) não devem ser utilizados pela semelhança com a proteína do leite de vaca. Bebidas à base de arroz, aveia, quinoa, dentre outras, não devem ser utilizadas pelo pobre valor nutricional.

9.       Meu filho recebeu fórmula à base de soja quando pequeno. Existe alguma chance dele apresentar problemas hormonais?
As fórmulas de soja não devem ser recomendadas a bebês menores de 6 meses de vida, por questões de segurança. A partir desta idade, as crianças podem receber fórmulas à base de soja como substituto do leite de vaca no caso de alergias mediadas por IgE e sem comprometimento gastrintestinal. Existem estudos em modelos animais relacionando alguns componentes da soja (fitoestrógenos) com o desenvolvimento de distúrbios neuroendócrinos (menstruação precoce, crescimento de mamas) em ratos. Até o momento os mesmos resultados não foram reproduzidos em humanos. Estudos adicionais são necessários, mas até o momento não há contraindicações formais que imponham a proibição das fórmulas de soja quando houver indicação.

10.   Como funciona a dessensibilização a alimentos?
A dessensibilização a alimentos consiste na oferta de doses ínfimas e crescentes dos alimentos (especialmente leite e ovo) em intervalos regulares, para que se obtenha um condicionamento do organismo a não reagir a determinadas porções dos alimentos que causam alergias. O procedimento deve ser realizado apenas por médicos experientes, em ambientes preparados para o controle de possíveis reações.

11. Quais as vacinas contraindicadas em pacientes com alergias alimentares?
Uma vez que algumas vacinas são inoculadas em embriões de galinha, em diferentes quantidades, existem algumas orientações sobre vacinação em alérgicos ao ovo, a saber:

  1. Tríplice viral (sarampo, caxumba e rubéola): pode e deve ser administrada em pacientes com alergia ao ovo, independentemente de sua manifestação clínica (incluindo anafilaxia).
  2. Vacina da gripe (Influenza, incluindo H1N1): indicada em pacientes com alergias leves e moderadas a ovo. Pacientes com urticária ao alimento devem ser observados por cerca de 30 minutos após a vacinação. O Ministério da Saúde (2014) contraindica a vacina para pacientes com história de anafilaxia ao ovo.
  3. Febre amarela: contraindicada em alérgicos ao ovo, diante de qualquer manifestação clínica.

Não existe nenhuma contraindicação formal de aplicação de qualquer vacina nos pacientes alérgicos ao leite de vaca. É necessário, no entanto, que os componentes de qualquer vacina sejam checados antes de sua administração para que não haja qualquer risco da introdução não avisada de proteínas de qualquer espécie.

12. Meu filho tem alergia ao leite de vaca, ele pode frequentar escola?
Sim, pode, desde que devidamente orientado. Não só os pais devem estar conscientes sobre a alergia alimentar, mas todos os responsáveis pelo cuidado do seu filho, bem como as pessoas de convívio próximo. Desta forma, para frequentar escola, os profissionais envolvidos devem ser orientados a respeito da alergia, o alimento envolvido, como evitar reações e principalmente, como agir nos casos de possível ingestão acidental. O ideal é que seu médico forneça um plano emergencial por escrito.

13. “Tenho um filho com diagnóstico médico de alergia alimentar e estou grávida novamente. Existe alguma forma de prevenir que meu segundo filho também apresente a alergia?”
A prevenção de alergias alimentares ainda é um aspecto controverso, mas algumas medidas parecem ser bem aceitas, tais como:

  1. Alimentação na gestante e nutriz: não há necessidade de restringir qualquer alimento da dieta, sob o risco de aumentar a chance de alergia da criança. O ideal é que a mãe consuma alimentos ricos em ômega-3 (especialmente peixes) e antioxidantes naturais (frutas, legumes, hortaliças), bem como diminua a ingestão de gorduras provenientes de manteigas e óleos.
  2. Aleitamento materno: de forma exclusiva até 6m e complementado com outros alimentos até 2 anos ou mais, de acordo com as recomendações da Organização Mundial de Saúde. No caso da impossibilidade do aleitamento materno, fórmulas especiais (parcialmente ou extensamente hidrolisadas) podem ser indicadas.
  3. Introdução de alimentos sólidos: deve ser preconizado da forma habitual, a partir dos 6 meses de vida. O retardo na introdução dos alimentos como forma de prevenção pode aumentar a chance de alergia, ao invés de preteger.